sábado, 13 de fevereiro de 2016

O TEMPO DA CONSOLIDAÇÃO DA IGREJA NO IMPÉRIO ROMANO

O tempo da consolidação da Igreja no Império Romano (70 - 180 d.C.)


            É o tempo do surgimento progressivo da “Grande Igreja”, que é consciente da unidade de todas as igrejas locais e vai organizando pouco a pouco uma estrutura administrativa de unidade. Vemos a formação de tal processo com: a difusão do cristianismo em todos os centros de Império graças a obra missionária; o nascimento de uma diversificação nas igrejas; a consciência de que esta diversidade arrisca de tocar também o coração do anúncio e que por isto há uma exigência de mais união entre as igrejas.
            Esta época é caracterizada por três elementos:
            1. difusão geográfica do cristianismo;
            2. consolidação da estrutura hierárquica nas igrejas locais;
            3. primeiras hostilidades do estado romano. É necessário distinguir três tipos de hostilidade:
                        - hostilidade dos judeus;
                        - hostilidade da sociedade pagã;
                        - hostilidade que se baseiam em atos legislativos da sociedade.
            Na literatura cristã deste período podemos distinguir dois gêneros: aquela que se dirige ao externo (apologia) e aquela interna que se preocupa de combater as heresias (contra).

A difusão do cristianismo

            - Palestina: antes do ano 70 d.C. a comunidade cristã tinha perdido prestígio porque as “colunas” tinham se dedicado à missão. Depois de 70 d.C. se tenta restabelecer uma comunidade tendo como guias parentes de Jesus. Mas a evangelização dos judeus encontra grandes dificuldades. Existe um judaísmo heterodoxo que considera importante a observância da Lei e da circuncisão; também a consideração de Jesus como Deus era um problema porque colocaria em perigo o rígido monoteísmo judaico. No início permanece uma oscilação entre as duas comunidades; depois pouco a pouco cresce a compreensão da diversidade entre as duas concepções e isto leva ao desencontro violento.
            Mas a hostilidade mais forte vem do judaísmo ortodoxo, dirigido pelos rabinos que recomeçam a tradição farisaica. A destruição do Templo tinha levado ao declínio sacerdotes e saduceus que contrabalançavam o poder religioso dos fariseus; estes tornam-se agora os verdadeiros guias: se trata de um processo que vai do ano 70 d.C. até o final do século II. Antes de 70 d.C. o judaísmo era mais pluralista, as várias correntes religiosas encontravam unidade em torno ao Templo que também essênios e cristãos respeitavam. Depois da sua destruição falta o elemento em torno do qual se sustentava a unidade. Também, de um ponto de vista econômico-administrativo, a população de Jerusalém era ligada ao Templo. Com o impor-se da corrente farisaico-rabínica aumenta a pressão unificante e não serão mais permitidos desvios ao interno do judaísmo. A tentativa de manter ao menos a unidade religiosa (aquela política não existe mais) faz desaparecer a tolerância precedente. Nestas condições a participação dos cristãos na sinagoga torna-se impossível. Estes fatos deixam o seu rastro sobretudo no quarto evangelho (cf. a hostilidade dos judeus com relação a Jesus). No seu Diálogo com Trifão o mártir Justino fala deste ódio difundido pela propaganda judaica não só na Palestina mas também em toda a diáspora. Por estes motivos o bispo de Jerusalém Simeão foi martirizado em 107 d.C. Em 135 d.C., o fracasso da revolta de Bar Kosiba significou o final da comunidade judeu-cristã de Jerusalém. A cidade passa a ser chamada da Aelia Capitolina onde foi proibido aos judeus e aos cristãos de origem judaica de morar. Depois destes fatos a comunidade cristã de Jerusalém pode ser composta somente por cristãos de origem pagã. Contudo a comunidade não conseguirá mais recuperar o antigo prestígio, mesmo se em 451 d.C. se tornará um patriarcado. Nos dois séculos sucessivos (II - III) Jerusalém aparece no segundo lugar depois de Cesaréia Marítima como importância. Junto a estas duas comunidades existiam outras igrejas situadas sobretudo nas cidades do litoral.

            - Síria: fazia parte da Arábia Romana. Podemos dividi-la em três zonas: a primeira corresponde a Síria atual; a segunda é a zona mais oriental submetida ao domínio persiano; a terceira é Antioquia, centro urbano que deve ser visto separadamente. Na primeira zona a evangelização progride nas cidades (Damasco, por exemplo), não conseguindo penetrar nas zonas rurais.
            Na segunda zona está a Síria Oriental com a sua capital Edessa que se distingue como centro missionário. Também a língua que ali se fala é diferente. Na busca de uma origem apostólica para esta Igreja se fingiu no século II-III uma troca de correspondência entre Jesus e o rei Abgar V; a igreja teria sido fundada por Judas Tadeu. Taciano compôs neste ambiente o seu Diatessaron depois de 172 d.C.: é a fusão dos quatro evangelhos em um, somando os vários elementos (temos por exemplo sete mulheres no sepulcro de Jesus). É um escrito em que falta claramente de uma unidade teológica. A difusão e organização desta igreja são testemunhadas por dois fatos diferentes: o sínodo de Edessa sobre o problema Pascal, citado por Eusébio; e uma inscrição de Abércio datada de 216 d.C. e conservada hoje nos Museus Vaticanos. Diferentemente da Síria Ocidental a evangelização nesta zona penetra também nas zonas rurais chegando ao Reino dos Partas.
            Na terceira zona temos Antioquia antiga fundação que aumenta a sua importância pelo grande prestígio do grande bispo Inácio (+117 d.C.). Teófilo bispo depois de 180 d.C., escreve uma apologia contra o paganismo. É um centro de grande cultura onde se desenvolve o “mono-episcopado”.

            - Egito: não sabemos quase nada do cristianismo no Egito antes do final do século II. A igreja de Alexandria se diz fundada por Pedro ou por Marco, mas se trata provavelmente de lenda posterior. Não parece ser facilmente sustentável uma difusão precoce do cristianismo no Egito. Contudo já em 180 d.C. encontramos uma comunidade cristã em condições de manter uma escola catequética guiada primeiramente por Panteno, depois por Clemente e Orígenes. Isto significa que já de antes a comunidade era vivaz e consistente.

            - Ásia Menor: o principal ponto da evangelização nos primeiros dois séculos não é nem no Egito nem na Síria mas na Ásia Menor. Além de Paulo, sem dúvida, existiram outros missionários muito ativos nesta área. As cartas de Inácio de Antioquia no início do século II assinalam a existência de várias comunidades na zona ocidental: Éfeso, Filadélfia, Tralle, Magnésia, Esmirna. Naturalmente atrás desta grande rede de comunidades estão as rotas navais. Tratam-se de cidades portuárias com conseqüente facilidade de comunicação. Daqui a evangelização se expandia para o interior. Junto ao testemunho de Inácio de Antioquia se soma àquela do Apocalipse. Em 1Pd 1,1 temos grande parte das regiões da Ásia Menor: Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia (que nesta época se referia a zona centro-ocidental da atual Turquia) e Bitínia. Com relação a Bitínia e ao Ponto temos também um testemunho não cristão, a carta de Plínio, o jovem, procurador junto ao procônsul destas duas províncias ao Imperador Trajano.

            - Creta: ali se encontram as comunidades de Knosso e Gortina, as duas mencionadas por Dionísio de Corinto, mas a tradição remonta a carta de Tito (mais ou menos em 130 d.C.), que pressupõe a existência de uma comunidade cristã cujas raízes se unem de algum modo a Paulo. A Igreja mais consistente na Grécia é aquela de Corinto, e a partir desta se conhece também aquela de Atenas, da onde vinha o apologeta Aristides.

            - Roma: no ocidente a comunidade que se sobressai è a de Roma. Não conhecemos o nome dos fundadores, embora esta comunidade celebre os apóstolos Pedro e Paulo. Contudo esta hipótese é insustentável. A carta de Paulo aos Romanos testemunha que no início esta comunidade é composta de judeu-cristãos, mesmo se não sabemos como estava organizada. Talvez em igrejas domésticas, ou seja, em casas de cristãos que estavam bem economicamente que possuíam casas espaçosas que podiam hospedar as assembléias da comunidade; ou segundo a distribuição das sinagogas.

            - Gália: temos os testemunhos chegados através das obras de Irineu de Lion e aquela de Eusébio de Cesaréia. Deve-se ao comércio e as sua vias de comunicação através do mar o início da evangelização na Gália. A primeira comunidade nasce em Marselha, cidade de fundação grega que conserva uma estreita ligação com a Ásia Menor. Dali a evangelização provavelmente subiu o rio Ródano chegando nas cidades fluviais (segundo a lenda Lázaro e as três Marias teriam chegado a Provenza com a escrava Sara, patrona dos ciganos). Como notícias históricas sobre as comunidades ao longo do Ródano temos uma carta de 177 d.C. das igrejas de Lion e Vienne que descrevem um progrom (uma perseguição não organizada pelo estado, mas popular) que aconteceu nas duas cidades. Nesta ocasião morreram muitos cristãos, certamente mais do que os dez dos quais se possuem o nome. Depois deste acontecimento Irineu se torna o bispo de Lion e, mesmo tendo origens asiáticas, a comunidade está em estreito contato com Roma.

            - África: como na Gália o primeiro testemunho tem relação aos mártires “cilitanos”, localidade não ainda identificada, provavelmente nas vizinhanças de Cartago. A presença no século III de tumbas cristãs e hebraicas na mesma área faz com que se hipótese que a missão tenha acontecido a partir de comunidades judeu-cristãs. Ponto de partida devia ser Cartago, o maior porto africano e dali se expandir para outros pontos. Em 220 d.C., 70 bispos se reúnem em um sínodo, o que faz supor que a evangelização tenha se estendido para a zona rural já que não existem grandes cidades nesta região.



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