O
MODERNISMO
Modernismo
são as tentativas do final do século XIX e início do século XX para tornar
possível uma conciliação entre a doutrina cristã e as ciências modernas,
principalmente o método histórico-crítico e, ao mesmo tempo, fazer reformas no
âmbito da disciplina eclesiástica.
Não
podemos confundir o Modernismo com as idéias do mundo moderno condenadas no “Syllabus”.
Perante
a crise do positivismo e um renovado interesse pelos problemas religiosos,
sacerdotes inteligentes e sinceramente zelosos percebiam que o vazio de muitos
espíritos podia ser preenchido somente por um catolicismo menos ligado a
esquemas tradicionais, que causavam uma insuperável desconfiança na mentalidade
moderna. As mesmas tendências apareciam nos países alemães, onde Franz Xaver
Kraus, se insurgia contra a centralização romana, Hermann Schell ressaltava a
urgência de uma maior participação de todos os católicos na vida da Igreja.
Diferentes
e mais profundas eram as exigências de homens levados mais ao estudo do que a
ações. Eles percebiam as graves lacunas que a cultura eclesiástica italiana e
estrangeira do final do século XIX apresentava nos estudos positivos. E a
filosofia abusava-se facilmente do método da autoridade, os pensadores modernos
eram pouco conhecidos, o sentido histórico muito limitado. Na teologia, a
orientação especulativa tinha o predomínio absoluto: basta pensar em Billot e
Lsunidade na especulação, mas muito pobres na parte positiva. Em geral, criavam
desconfiança em relação a tudo o que viesse de ambientes não estritamente
ligados a Roma.
Difundiam-se,
portanto nos ambientes católicos no início do século, um sentimento de
mal-estar, uma ânsia de atualização, que apresentava todo um amplo leque de
atitudes. Os modernistas tendem, no mínimo, a relativizar o momento intelectual
das fórmulas da fé e do dogma. Eles sublinham o predomínio de categorias como
“vida”, “desenvolvimento”, “experiências religiosas” etc. A fé segundo os
modernistas não se apóia na história que pretende nos mostrar a identidade
entre o Jesus histórico e o Jesus que é objeto da fé, esquecendo que, com a fé,
dá-se um salto para categorias que nos transportam para um terreno diferente.
Tende a fazer da religião e da fé a simples expressão das próprias experiências
interiores.
Razão
e fé não são distintas, mas separadas, dado que se chega à fé com um ato
irracional, uma adesão cega. As conclusões históricas, que levam a admitir em
Cristo um homem falível, que não operou milagres, não prejudicam a fé em Cristo
como Deus, que se baseia em nossa inefável e indizível experiência interior.
Em
síntese, a Igreja deve ser completamente renovada, abandonando as vestes já
superadas; para atingir esse fim, é preciso agir de dentro da Igreja, não
abandoná-la nem separar-se dela, evitando o erro dos protestantes, que tornou
estéril a ação deles. É preciso, ao contrário, imitar os Jansenistas,
divulgando na Igreja, de modo escondido e sem as trair, as novas idéias, e, se
for o caso, é preciso resistir aos superiores, porque há uma desobediência à
letra que constitui uma autêntica obediência ao espírito.
6.1.
Principais
Protagonistas
a) Alfred Loisy (1857-1940)→ A tentativa de uma
renovação da Igreja em sentido heterodoxo e radical começa com este personagem.
Foi ordenado sacerdote depois de muitas incertezas de sua parte, ensinou no
Instituto Católico de Paris. Na hipótese de Houtin, Loisy teria vivido por anos
e anos, uma comédia, procurando dar de si mesmo uma imagem de sacerdote crente,
devoto e respeitoso. Foi destituído de suas funções sacerdotais em 1893 quando
sustentou a não autenticidade do Pentateuco como sendo escrito por Moisés e a
natureza não histórica-cientifica dos dois primeiros capítulos do Gênesis, ou
seja, por suas idéias cada vez mais audaciosas. Com isso, aproveitou o tempo
que lhe sobrava, para tentar uma síntese, da qual expôs alguns elementos
fundamentais no “Évangile et L Église”,
publicado em 1902, provocando imediatamente grande alvoroço nos círculos
intelectuais franceses e uma vigorosa resposta por parte do pe. Grandmaison, do
pe Lagrange e de D. Batiffal. O estudioso francês procurava resolver o problema
da diferença entre o “antes” e o “depois”, entre o Jesus histórico, de um lado,
e a Igreja e o dogma, de outro. Tem-se repetido com freqüência esta frase como
o núcleo central do pensamento de Loisy: “Jesus
pregou o Reino de Deus, ou seja, a salvação oferecida a todos, mas nasceu a Igreja”.
Para Loisy, a Igreja era, de fato, a única forma pela qual, depois da morte de
Jesus, podia sobreviver o anúncio do Reino pregado por Cristo.
Em
1903 escreveu outra obra chamada: “O
autor de um pequeno livro”. No dia 16/12/1903, três meses e meio depois da
eleição do novo Papa, foram postas no “Index”
as cinco obras de Loisy. No dia 07/03/1908 foi excomungado. Ele continuou até o
fim da vida numa orientação cada vez mais racionalista, chegando até a negar
qualquer fundamento da religião cristã e a tentar substituí-la por uma religião
humanitária, na qual a Sociedade das Nações e o presidente Wilson ocupariam o
lugar da Igreja e do Papa. Morreu sem renunciar à sua atitude.
b) George Tyrrel (1861-1909)→ Nascido e educado no Calvinismo,
converteu-se ao catolicismo e entrou para a Companhia de Jesus. A sua atitude
cada vez mais impaciente em relação ao clima da Companhia, impregnada no seu
modo de pensar, de um mesquinho autoritarismo estranho ao espírito do fundador,
convenceu-o e a seus superiores da impossibilidade de ele continuar na Ordem. Faz uma crítica a Igreja: quando contrasta a
Igreja pobre de Cristo e a Igreja rica da instituição. Propõe que a Igreja
tenha uma postura mais social. De repente, no dia 01/01/1906, publicou um
artigo num jornal da Itália que se intitulava como: “Carta a um Professor de
Antropologia”; logo se descobriu que ele era
o autor, um mês depois, foi expulso da
Companhia, e, não tendo sido aceito em nenhuma diocese, foi automaticamente
suspenso das funções sacerdotais[1].
Mais tarde, a um mês da “Pascendi”,
em Outubro de 1907, sua reação negativa à Encíclica provocou não propriamente a
excomunhão, mas a sua exclusão dos sacramentos. Morreu em 1909, Tyrrel exaltava
a liberdade de consciência e rejeitava toda autoridade. Loisy é sobretudo um
exegeta e um historiador; Tyrrel, um Filósofo e um Teólogo; um e outro tendem à mesma meta
por caminhos diferentes.
c) Friedrich Von Hugel
(1852- 1925)→ A sua origem (pai austríaco e mãe escocesa)
Devido ao domínio de várias línguas, mas, sobretudo a sua vivíssima
inteligência e a sua abertura a todos os diversos círculos nacionais, foi chamado
de o “bispo leigo do século XX”.
Percebe-se também nele a tentativa de unir, a uma real fidelidade à Igreja, a
reivindicação de uma liberdade plena de pesquisa e a inata hostilidade ao que
ele chamava de absolutismo curial.
Na
Itália, o movimento modernista não teve grande repercussão no público médio,
mas formou um grupo restrito de alguns intelectuais e de alguns sacerdotes.
Entre eles, podemos lembrar de Tommaso Gallavat; Scotti, Stefano Jacini,
Alessandro Casati, reunidos em torno da revista Milanesa “IL Rinnovamento”. Iniciado em Janeiro de 1907, o periódico
recebia, em abril, uma advertência por parte do cardeal prefeito da Congregação
do “Index”: o cardeal Ferrari;
comunicou o aviso aos interessados.
d) Ernesto Buonaiuti (1881- 1946)→ Professor de história
da Igreja no Seminário de Apollinare e depois, desde 1915, na Universidade de
Roma, o qual passou rapidamente da moderação inicial à nítida rejeição do
intelectualismo estático à dura polêmica da revista “Nova et Vetera” (1908), que reduz a mensagem cristã a uma
tentativa de reforma social. Depois de 1920 o seu radicalismo sofreu uma
evolução em sentido oposto, para teses menos adversas às tradicionais, ainda
que talvez distantes da ortodoxia. Buonaiuti permaneceu no seio da Igreja até
1921. Excomungado, submeteu-se para provocar logo com novas publicações outras
excomunhões, em 1924 e em 1926. Depois de 1931, foi completamente afastado da
cátedra não em conseqüência do tratado de fidelidade ao fascismo, imposto a
todos os professores universitários; e, em 1946, Buonaiuti faleceu, recusando
as propostas de reconciliação com a Igreja.
e) Romolo Murri (1870-1944)→ Foi
um dos principais animadores do movimento da Democracia cristã. Murri; em 1905,
colaborou ativamente para o nascimento e o desenvolvimento da liga democrática
nacional, logo desautorizada por Pio X. As divergências disciplinares e
doutrinais levaram à suspensão “a divinis”
(1907) e à excomunhão de Murri (1909), que ressaltou na “Revista Cultural” o tom anti-hierárquico de sua campanha. Morreu
reconciliado com a Igreja. O afastamento da Igreja aconteceu essencialmente
pela reivindicação de uma autonomia dos católicos no campo político, que
acabara por se transformar em revolta disciplinar, justificada pela distinção
dos planos e das competências.
Muito
importante foi a ação de três cardeais, o secretário de Estado Merry del Val; o
prefeito da Congregação Consisterial, De Lai; o prefeito do Index, o capuchinho
Vives y Tutó. Merry del Val era conhecido por sua profunda piedade, por sua
severa ascese, mas também por seu temperamento batalhador e seu zelo
intransigente.
No
final de Abril, a Congregação do “Index”
advertia os redatores da revista “IL
Rinnovamento”.
Pio X viu o Movimento modernista como algo
perigoso e a atuação da Igreja foi muito forte para combater esses perigos.
Antes de 1907, a
partir de 1905, temos as decisões da comissão bíblica; vários documentos foram
publicados, documentos relativos àquilo que os exegetas estavam tentando
manter, isto é, a exegese tradicional:
- Autenticidade Mosaica do Pentateuco;
- O sentido literal histórico dos três
primeiros capítulos do Gênesis[2];
- Autenticidade das cartas pastorais;
- Uniformidade do livro de Isaias.
Em
03/07/1907, o Decreto “Lamentabili” condenava 65
proposições, tiradas em geral das obras de Loisy, relativas à autoridade do Magistério
Eclesiástico, à inspiração da Sagrada Escritura, à objetividade e imutabilidade
dos dogmas, à divindade de Cristo, à origem divina da Igreja e dos sacramentos.
Em
08/09/1907, foi publicada a Encíclica
“Pascendi Dominici Gregis”.
Ela se divide em duas partes: teórica e prática, mas é idêntica em ambas a
dureza de tom e expressões, que lembra a “Mirari
Vos” e a “Quanta Cura”. Por
exemplo, os motivos que impulsionavam os estudiosos a formular novas teorias
são para o Papa, apenas soberba ignorância e vã curiosidade; o modernismo é
definido com uma fórmula que se tornou celebre: “soma de todas as heresias”. A encíclica condenava a
rejeição das provas clássicas tradicionais sobre a existência de Deus; a
redução da revelação a uma experiência religiosa interior; a concepção dos
dogmas como simples instrumentos para comunicar aos outros a própria
experiência religiosa; a separação radical entre ciência e fé.
Os
modernistas, todavia, logo protestavam por não terem sido compreendidos.
Buonaiuti, com algumas sugestões de Fracassini e de Simeria, publicou
imediatamente, de forma anônima, O programa dos modernistas, no qual,
declarava que o pensamento deles tinha sido adulterado. O autor foi excomungado.
A
segunda parte da Encíclica tem várias posições severas destinadas a reprimir a
infiltração modernista:
→Vigilância dos professores dos seminários e
das universidades, com o afastamento de quem introduzir novas idéias;
→Seleção rigorosa dos ordenandos;
→Aumento da censura.
→Proibição de Congressos de Sacerdotes.
→Instituição da primeira Comissão Especial em cada Diocese para
indagar sobre eventuais indícios de Modernismo, com obrigação de enviar
periódicos relatórios a Roma.
Dois
meses depois, em novembro de 1907, o Motu Próprio “Proestantia Scripturae” comunicava a excomunhão de todo àquele que
se opusesse à Encíclica: em dezembro, era condenada a Revista “IL Rinnovamento”. O Motu Próprio “Sacrorum
Antistitum”, de 17/07/1910, impôs aos religiosos na pastoral e no
ensino um especial juramento anti-modernista. Na Alemanha este juramento suscitou
várias discussões entre os docentes universitários, estes foram dispensados dessa
obrigação. O Moto proibia também aos seminaristas e aos estudantes dos
institutos religiosos a leitura de qualquer jornal.
Marie
Joseph Lagrange (1855-1938)- Dominicano, fundou a revista bíblica francesa e
vai ser fundador da Ecole Biblique de
Jerusalém. A partir daí a Santa Sé vai fazer com que os Jesuítas fundem uma
Escola Bíblica em Roma em 1909 para se contrapor a escola dos Dominicanos em
Jerusalém.
Grave
foi a atividade desenvolvida por Umberto Berigni, professor de história no
Apollinare. Trabalhou na Cúria Romana e nos anos críticos do modernismo, ele
fundou, em 1906, “La Corrispondenza
Romana ”, que se tornou em 1906, “La
Correspondance de Rome”, e reuniu em torno de si os seus
correspondentes numa associação secreta, o “Sodalitium
Pianum”, composta de 50 membros que tem como objetivo recolher informações
daqueles que eram vistos como suspeitos de modernismo (até cardeais ou gerais
de ordens religiosas), e de transmiti-los diretamente ao Papa. Vai ser instituído por Pietro Gasparine
secretário de Estado de Bento XV e em 1921 Bento XV vai dissolver o “Sodalitium
Pianum”.
Ao
mesmo tempo, proibiam-se nos Seminários o texto de história de Funk, foi posto
no “Index” a “Storia della Chiesa” de Duchesne (1843-1922), então diretor da “Ecole Francaise de Rome”.
Contemporaneamente, repetiam-se as visitas apostólicas nos Seminários e nas
Dioceses. O próprio Ângelo Roncalli, recebeu claras advertências do cardeal De
Lai, por estar lendo um livro, cujo o autor era suspeito de Modernismo.
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