sábado, 27 de fevereiro de 2016

PATROLOGIA

A DISCIPLINA "PATROLOGIA"

A palavra "Patrologia" é formada pelas duas palavras gregas naTrjp = pai e aó­yog ° tratado ou doutrina; significa, portanto, literalmente, "a ciência dos Pa­dres/Pais (da Igreja)".

I. O Conceito de "Pai/Padre"

O título cristão honorífico de'Pai/Padre" inclui uma gama de imagens per­tencentes ao acervo comum humano, ao Antigo Testamento e ao mundo gre­co-romano: o pai como gerador da vida e corno cabeça da família, a quem com­pete igualmente o cuidado por ela como também a tarefa de dirigi-la com sua autoridade, como guardião e mediador da experiência e da tradição e por isso corno auténtico mestre, também e sobretudo da fé. 0 paler familias romano é o sacerdote do culto doméstico: os genitores. na compreensão do Antigo Testamento. são os representantes de Deus na família. os patriarcas são os guardiães da promessa e os fiadores da graça da Aliança com Deus (cf. Edo 44-50; Lc 1,55), aos quais por isso se devem obediência e veneração.
Esse conceito natural de pai se estendeu a "os Pais' tos antepassados) como também ao `pai espiritual" ou `intelectual' e "eclesiástico" (o mestre, o diretor de uma escola de filosofia. o rabino). Os apóstolos de Cristo (cf., p. ex., I Cor 4,140 e os bispos da Igreja são, neste sentido transposto, os Pais dos cren­tes, porque eles no batismo são os criadores da nova vida. no anúncio e na expo­sição da fé são seus mestres e educadores e como dirigentes da comunidade são as autoridades e os guardiães da "família". A Igreja Antiga atribuía por isso, a partir do séc. IV. o título de Pai aos bispos exclusivamente, e só a partir do séc. V aplicou.o também aos sacerdotes (p. ex. lerõnimo) e aos diáconos (p ex. Efrém o Sírio). Até hoje se conserva em muitas línguas o título de "pai = padre" para designar o sacerdote (Patoo father. pene, padre).

II. Padre/Pai da Igreja - Doutor da Igreja - Escritor Eclesiástico

O conceito de "Padre da Igreja" evidencia um aspecto da rica figura patervela pela sucessão ininterrupta da fé desde os apóstolos bem como pela conti­nuidade e unidade da Q. na cal mnhão com a Igreja. Ele é o fiel mestre da fé. ao qual se pode recorrer nas dúvidas de Q. Essa autoridade na verdade não torna o Padre da Igreja individualmente inerrante em todos os pormenores  ele deve se ater à Sagrada Escritura e à regula lidei da Igreja universal  mas, em sinto­nia com elas, ele é testemunha auténtica da fé e da doutrina da Igreja. A partir do séc. IV. os bispos que se destacaram particularmente na transmissão. na exposição e defesa da fé os primeiros foram os do Concílio de Nicéia (325)  re­ceberam o título de "Padres da igreja" ou "Santos Padres". Basílio Magno pela primeira vez, no sentido de 'prova patrística" (argamen tatio patri.sticaj, acres­centou à sua obra De sp(ritu .souto (374/75) uma lista de Padres da Igreja para apoiar sua opinião doutrinária [cap. 29]. Agostinho serve-se dessa lista a partir de 412, especialmente na controvérsia contra o pelagianismo, e Cirilo de Alexandria fez ler durante o Concílio de Efeso (431). como prova de sua própria ortodoxia, trechos de obras deles. que o Sínodo aceitou oficialmente e incluiu em suas atas. Vicente de Lérins criou, finalmente. o clássico conceito de "ma­gistrì probabiles"em seu Conimonitorima (434) e desenvolveu a teoria da prova patrística [cap. 41].
Por causa da importância que têm como testemunhas privilegiadas da tra­dição viva da Igreja. os Padres da Igreja são definidos tradicionalmente segundo quatro critérios
Doctrina orthodoxa: Em toda a sua teologia, devem estar em comunhão doutrinária com a Igreja universal, o que porém não significa isenção absoluta de erro em todos os pormenores de sua doutrina.
Sanetitas vitae: Santidade no sentido da igreja primitiva, em que a vene­ração dos santos se apoiava não na canonização expressa. mas no reconhecimento e na veneração da vida exemplar por parte do povo fiel.
Approbatio ecclesiae: 0 reconhecimento, embora não necessariamente expresso, de sua pessoa e doutrina por parte da Igreja.
4..Intiquitas: Eles devem pertencer ao período da Igreja antiga.
0 papa Bonifácio VIII concedeu em 1295 pela primeira vez aos Padres da Igreja latina Ambrósìo, Jerõnimo, Agostinho e Gregário Magno o título honorí­fico de Doutor da Igreja": o papa Pio V, em seu Breviário de 1568. elevou ao mesmo grau os Padres da Igreja grega Atanásio, Basílio Magno, Gregório de Nazianzo e João Crisóstomo. Desde essa época foram reverenciados coma "os quatro grandes doutores da Igreja do Oriente e do Ocidente" e como tais foram tema de muitas representações artísticas. 0 conceito de Doutor da Igreja corresponde ao de Padre da Igreja. sem no entanto estar limitado ã Antiguidade. Em lugar do quarto critério entra aqui o exímio valor doutrinal (eminens doc­trina). A elevação expressa de Padres da Igreja à categoria de Doutores da Igre­ja quer salientar e honrar sua extraordinária importância como eminentes transmissores da fé e da doutrina da Igreja: em 1722 Isidoro de Sevilha, em 1729 Pedro Crisólogo, em 1754 Leão Magno, em 1851 Hilário de Poitiers. em 1882 Cirilo de Alexandria e Cirilo de Jerusalém, em 1890 João Damasceno. em 1920 Efrém o Sírio.
Autores cristãos antigos, que não satisfazem uni ou mais dos três primeiros critérios de Padre da Igreja, mas pertencem à Igreja Católica, são chamados de "escritores eclesiásticos". Todos os demais escritos cristãos antigos. mas nao eclesiásticos (p. ex., apócrifos, obras heréticas etc.). fazem parte do âmbito mais amplo da literatura "cristã primitiva" ou literatura `cristã antiga".
A limitação do conceito de Padre da Igreja à Antiguidade só ocorre na Idade Moderna. Jean Mabillon (1632-1707) ainda considerava Bernardo de Claraval (t 1153) como o último dos Padres. e Jacques-Paul Migne (1800-1875) finalizava sua monumental obra Patrologia Graeca com Genádio II de Constantinopla (t depois de 1472)  abrangendo. portanto. toda a literatura bizantina  e a Patrolo­gia Latina com o papa Inocêncio III ((it 1216). E verdade que se aceita hoje a res­trição à Antiguidade. mas sua delimitação cronológica é bastante discutível. Os manuais tradicionais  inclusive o presente  terminam no Ocidente com Isidoro de Sevilha (j 636) e no Oriente com João Damasceno (t c. 750). Cresce, porém. o número dos que opinam coin bons motivos que a época dos Santos Padres termi­na já em meados ou final do séc. V. mas até hoje a opinião deles não se impôs. (Quanto à periodização da Patrística, cf. as introduções às partes II até IV).

III. Patrologia - Patrística - História da Literatura

Ao longo da história desta disciplina, criaram-se, também no âmbito confes­sional entre católicos e protestantes, três classificações e definições diferentes:
Patrística significa desde o séc. XVII a ideologic patrística. especialmente a dogmática dos Padres em contraposição à theologia bíblica, scholastica etc.
O conceito de Patrologia foi utilizado pela primeira vez pelo teólogo protes­tante Jodo Gerhard (t 1637) como título de sua óbra póstuma publicada com o titu­lo Patrologia sive de primitivae Ecclesiae Christianae Docforum cita ac lucubra­tionibus (Patrologia ou vida e obras dos Doutores da Igreja cristã primitiva [Jena 16531), no sentido de estudos dos Padres do ponto de vista histórico e literário.
Na virada do séc. XX, por causa do desenvolvimento geral das ciências históricas e filológicas, começou unia discussão acirrada sobre a extensão e o objetivo da doutrina dos Padres, e julgou-se que ela deveria conseqüentemente ser considerada e tratada como parte da literatura universal, como literatura crista primitiva ou literatura crista antiga, sem desconhecer o seu caráter teo­lógico, por causa de seu objeto.
Uma segunda definição de literatura cristã a distingue, por outro lado, da Patrologia e da Patrística como disciplina não teo­lógica da filologia dos escritores cristãos primitivos.
Em geral, hoje os três nomes desta disciplina são empregados mais ou menos sem diferenciações: por outro lado, não emudeceu a discussão sobre a sua exata definição. Sem poder entrar aqui no mérito dos argumentos acima referidos, esta obra emprega apenas os conceitos "patrística/patrístco" e "patrologia":
- Patrística/patrístico = a era dos Padres/pertencente à época, aos escri­tos, ao pensamento etc. da literatura cristã antiga.
- Patrologia = ciência da literatura cristã antiga.
Todavia, a Patrologia não se identifica totalmente com a ciência que estuda a literatura universal. mas conserva propositadamente em seu nome o conceito de Padre/Pui, para tornar claro que se trata necessariamente de um ramo da teo­logia. cujo núcleo essencial são os Padres da Igreja e seus escritos no sentido eclesial. Mas, desde que, para compreender e explicar estes escritos em seu sig­nificado mais amplo, é necessário levar em consideração toda a literatura cristã antiga e seu ambiente, a Patrologia moderna é a ciência que trata a literatura cristã antiga em todos os seus aspectos e com lodos os métodos apropriados

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