sexta-feira, 17 de fevereiro de 2017

FÉ E SACRAMENTOS



FÉ E SACRAMENTOS
INTRODUÇÃO

No mundo secularizado que tem por deusa a razão e no qual a ciência é quem dita os parâmetros do cotidiano da humanidade, nos deparamos com situações que muitas vezes são inexplicáveis, então a única saída é buscar uma resposta por meio da fé. Mas em que consiste a fé? Qual o conceito que se tem de fé, num mundo que se torna cada vez mais incrédulo e ateu?
O senso comum define a fé como acreditar naquilo que não se vê; porém, a fé tem raízes mais profundas, nas quais desde a antiguidade move povos e nações a manifestar a sua crença numa divindade ou em vários deuses. No entanto, nos deteremos sobre a fé da Igreja Católica no âmbito restrito dos Sacramentos.
1.    O QUE É A FÉ?
Na história da salvação, a fé foi vista por vários âmbitos. O Antigo Testamento compreende a fé como anseio por uma salvação prometida, ainda obscura, sendo neste caso, objeto de esperança e de confiança na vinda do Messias, que libertaria todo o Israel. Essa fé é consumada com a vinda do Salvador, o ungido do Pai: Jesus Cristo.
No Novo Testamento, “crer” é aceitar a pregação (testemunho) dos apóstolos sobre a paixão, morte e ressurreição de Jesus; é aceitar o quérigma cristão como verdade de fé (At 2,44; 4,4.32; 8,13).
Na visão Paulina, é pela fé que se tem acesso ao mistério, ao Evangelho, à palavra pronunciada por Deus. Para São Paulo, a fé, é a acolhida da palavra (Rm 10,16; Gl 3,5), é a obediência ao Evangelho (Rm 1,5). Assim, temos como “expressão” da teologia da revelação paulina: a “obediência da fé” (II Cor 10,5; Rm 16,26).
Na visão dos Padres da Igreja[1], que são as primeiras testemunhas da viva tradição, a dimensão da fé esta relacionada com a visão do Novo Testamento. Para eles a fé “é o ponto inicial duma penetração sempre mais profunda da verdade recebida, de uma busca da inteligência, sempre mais intensa e ardente”.[2]
Segundo o Catecismo da Igreja Católica (CICat), a fé “é a resposta do homem a Deus que se revela e a ele se doa, trazendo ao mesmo tempo uma luz superabundante ao homem em busca do sentido último de sua vida”.[3]
Diante de todos esses conceitos expostos acima, temos um panorama geral sobre a fé. Portanto, fé é a resposta livre e consciente do homem que aderindo a Deus que se revela e também aos seus desígnios de salvação e por amor o faz participar de sua vida divina. Em poucas palavras, a fé é abrir o nosso coração ao amor de Deus, que se humanizou no Cristo pela encarnação.
2.    CARACTERÍSTICAS DA FÉ
Uma vez sabendo o que é a fé, como podemos caracterizá-la? As características básicas da fé segundo a definição do CICat são: é uma graça, é um ato humano, a fé está relacionada à inteligência, a liberdade da fé, a necessidade da fé, e a fé como começo da vida eterna.
a)     A fé é uma graça: é um dom pelo qual Deus cumula o homem com uma virtude sobrenatural, para que este volte o seu coração, sua mente para aquele que o criou. É Deus quem dá a graça de conhecê-lo e com o auxilio do Espírito da Verdade, move o coração do ser humano e faz com que se converta ao Criador. O mesmo Espírito “abre os olhos da mente e dá a todos a suavidade no consentir e crer na verdade”.[4]
b)     A fé como um ato humano: não vai de encontro com as faculdades humanas da vontade, liberdade e da inteligência, pois não impede que o homem acredite em Deus e aceita as verdades de fé que são inerentes à pessoa que crer. Pelo contrário, estas faculdades cooperam com a ação da graça divina no homem, fazendo com que este adira com todo o coração.
c)     A fé está relacionada à inteligência: tem como ponto de partida o “crer”, que não significa apenas aceitar as verdades reveladas que são inteligíveis e compreensíveis pela razão natural. Mas, é crer na revelação de Deus, como fato verdadeiro, que tem a autoridade de quem se auto-revela e “que não pode nem enganar-se nem enganar-nos”.[5] A certeza da fé está fundada na Palavra de Deus, no entanto, as verdades reveladas podem ser obscuras para a razão e para a experiência humana, por isso é que “a certeza dada pela luz divina é maior que a que é dada pela luz da razão natural”.[6] Então a fé procura compreender, cada vez mais a Revelação divina e todo o seu conteúdo de Salvação, fazendo de tal modo que quanto mais se conhece mais a fé aumenta. Nesta busca constante se chega ao conhecimento do mistério central da Revelação: Cristo, última e definitiva comunicação de Deus.
d)     A liberdade da fé: leva o homem espontaneamente a aderir e responder a Deus com seu amor e gratidão a toda a revelação e a salvação trazida pelo Verbo divino quando se fez carne e habitou entre nós”[7] (Jo 1,14). Com efeito, Cristo não obrigou a ninguém para que aceitasse a sua mensagem, mas livremente convidou a todos para o arrependimento e a conversão do coração, para que chegassem a salvação e a contemplação da glória celeste.
e)     A necessidade da fé. Para que o homem seja salvo é preciso que ele creia firmemente em “Cristo e naquele que o enviou” (Mc 16,16), o Pai. Mas, não basta só crer, é preciso perseverar na fé, de tal modo que possamos alimentá-la com a Palavra de Deus e com os sacramentos. Para isso, basta lembrarmos do pedido dos apóstolos a Jesus, “Senhor aumenta em nós a Fé!” (Lc 17,5), esta deve ser a nossa atitude de cada dia, imploremos ao Senhor da Messe que aumente cada vez mais a nossa pouca fé.
f)       A fé é o começo da vida eterna. Pois ela nos faz sentir, aqui na terra, a antecipação das alegrias eternas e do que será a visão beatífica, a contemplação de Deus face a face (I Cor 13,12). São Basílio referindo-se a visão beatifica produzida pela fé diz: “enquanto desde já contemplamos as bênçãos da fé, como um reflexo no espelho, é como se já possuíssemos as coisas maravilhosas que um dia desfrutaremos, conforme nos garante nossa fé”.[8]
Então é preciso gozar das alegrias celestes nesta vida, buscando estar na presença do Senhor e deixar ser guiado pelos seus desígnios, abrindo o coração para a sua graça santificante em todos os sacramentos na esperança de um dia estar diante do Trono aclamando junto com os Anciãos e todos os Santos “Santo, Santo, Santo Senhor Deus Todo-poderoso”.[9] (Ap 4,8).

3.    A MINHA FÉ NOS SACRAMENTOS
Para falarmos da fé de quem recebe o sacramento, e sobre a eficácia do mesmo é preciso esclarecer alguns pontos que durante a História da Igreja foram motivos de contradições, de heresias e até mesmo de cisma, como é o caso do Protestantismo.
Diante de tantas controvérsias em torno dos sacramentos só no séc. XVI, com o Concilio de Trento, é que vamos ter uma definição clara sobre a doutrina sacramental. Trento afirma que os sacramentos são eficazes por si mesmos, agem “ex opere operato”, não dependendo do ministro que administra ou da pessoa que o recebe.
No entanto, podíamos nos questionar: qual o valor da nossa fé no sacramento? Pela fé nós fazemos com que a graça recebida pelo sacramento, tenha penhor de salvação, frutifique em nós e nos leve cada vez a santificação e perfeição.  Quanto maior a fé, maior será a eficácia pessoal em vista de minha santidade.
Para que haja a frutificação da graça santificante em nós, é preciso a abertura do coração e da alma deixando a graça entrar e abundar o ser. Como efeito da graça recebida nos sacramentos tem-se a transformação interior e a força para vencer o pecado e todas as imperfeições, para alcançar à santificação e como fim último à salvação.
Essa santificação é a deificação do homem, ou seja, com a graça santificante o homem tem a participação real na vida divina e assim, como efeito de tão grande mudança interior ele torna-se um outro Cristo, age como Cristo. Essa deve ser a atitude de todo cristão, que participa de qualquer sacramento.
CONCLUSAO
Fé e Sacramentos são duas realidades inseparáveis da vida cristã. Pela fé respondemos a Deus que amorosamente comunicou-se conosco e nos fez partícipes da sua vida divina. Também pelos Sacramentos, todos os dias ele nos dá a sua graça santificante e nos faz mais próximos de si, por isso, devemos estar bem preparados, munidos com os instrumentos necessários para participar fervorosamente de todos os sacramentos.
Destes instrumentos quem nos fala claramente é São Paulo: “cingi os vossos rins com a verdade e revesti-vos da couraça da justiça ... empunhando sempre o escudo da fé. E tomai o capacete da salvação e a espada do Espírito, que é a Palavra de Deus”. (Ef 6,14.16-17).
Portanto, a fé nos sacramentos é essencial para a nossa salvação, ela é o escudo que nos protege contra os dardos da infidelidade e da descrença, por isso, tomemo-na sempre para que cada vez mais sejamos santos ministros e caminho de salvação para as almas.
BIBLIOGRAFIA

A Bíblia Sagrada de Jerusalém. 3ª ed. São Paulo: Paulus, 2004.
AQUINO, Santo Tomas de. Suma Teológica. São Paulo: Loyola, 2000. (II-II, 171,5, obj. 3)
CATECISMO, Igreja Católica. São Paulo: Ed. Loyola, 2000. p. 49 e 488.
DEZINGER, Schönmetzer. Enchiridion Symbolorum, definitionum et declarationum de rebus fidei et morum. Números: 3006-3008.
Documentos do Concílio Ecumênico Vaticano II. São Paulo: Paulus, 2001. (Dei Verbum)
LATOURELLE, René. Teologia Ciência da Salvação. São Paulo: Paulinas, 1971.
_________________. Teologia da Revelação. São Paulo: Paulinas, 1969.
LATOVA, Miguel Paz. Los signos del encuentro com  Cristo. Teologia dos sacramentos em geral. Cidade do México: Nova Evangelização, 1999.
MCKENZIE, John L. Dicionário Bíblico. São Paulo: Paulus, 1983. p. 341-343.
SADA, Ricardo; MONROY, Alfonso. Curso de Teologia dos Sacramentos. 2ª ed. Lisboa: Reis dos Livros, 1991.


[1] A expressão “Padre da Igreja” é caracterizada por quatro traços: 1) Antiguidade, grandes teólogos dos séc. II até o séc. VIII; 2) Ortodoxia do ensinamento; 3) Aprovação da Igreja e 4) Santidade de vida. Também esta época pode ser chamada de “Patrística”.
[2] LATOURRELE, René. Teologia da Revelação. 1970 p. 164.
[3] Cf. CICat, 26.
[4] Idem, 153.
[5] Conc. Vaticano I, DF, c. 3: DS 3008.
[6] Tomás de Aquino, S. Th. II-II, 171,5, obj. 3.
[7] Et Verbum, caro factum est. Et habitavit nobis”.
[8] S. Basílio, Líber de Spiritu Sancto. 15,36: PG 32,132.
[9] “Sanctus, Sanctus, Sanctus Dominus Deus Sabaoth”

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